LOCAÇÃO HÍBRIDA OU MISTA
- Advocacia Renato Cunha
- 5 de jan. de 2021
- 4 min de leitura
Atualizado: 23 de ago. de 2021

Locação hibrida (comercial e residencial)
Vamos iniciar esta apertada síntese com a definição do que se entende por locação hibrida. A Lei 8245/91 que regulamenta a locação, residencial e a não residencial (comercial), não trata especificamente daquelas locações que servem ou são locadas para as duas finalidades (comercial e residencial).
No entanto, a jurisprudência (decisões da justiça) tem enfrentado tais situações determinando e adotando procedimentos legais que o contrato de locação e a realidade fática dos casos explicitam quanto à finalidade preponderante do imóvel. Assim, os procedimentos legais em relação à locação comercial ou residencial dependem da preponderância de cada finalidade em relação ao imóvel locado.
Aparece aqui um novo termo com algum grau de subjetividade que é a preponderância. Exemplificando, um salão comercial provido de uma instalação que propicie residência, ainda que mínima, será tratado como locação unicamente comercial? Por outro lado, uma casa que contenha um escritório apartado, ainda que em monobloco, deveria ser tratado unicamente como locação residencial? E como tratar a locação de um imóvel de 100 m2 onde 50% foi construído para servir como moradia e os outros 50% restantes, como escritório ou comércio?
A resposta depende, ao meu ver, de como os que se comprometeram e aceitaram a locação no contrato locatício, locador e locatário, e fundamentaram o “pacta sunt servanda” - (faz lei entre as partes quando uma lei maior não os impede).
O tema principal aqui é tentar elucidar as características e as cautelas necessárias neste tipo de transação imobiliária, a locação hibrida. Assunto este exacerbado pelas necessidades que a pandemia causou e vem causando.
O home office, o confinamento imposto pela pandemia, a qualidade de vida do interior, a proximidade e facilidade de acesso a grandes centros urbanos e a possibilidade de redução de custos em uma economia já tão fragilizada, despertaram o interesse pela locação de imóveis híbridos, aqueles onde é possível estabelecer um negócio e, ao mesmo tempo, oferece possibilidade de moradia.
Essa opção de imóvel não é nova e muito menos rara. Muitos imóveis foram construídos tendo ao nível da rua um salão comercial e, no segundo piso, uma residência. Hoje, no entanto, a pandemia dificultou o uso destes salões, na maioria dos casos, além de que o custo da locação é obviamente maior. Referidos salões e moradias conjuntas ainda são buscados, mas não tanto como em um passado recente.
Já o “home office”, com a tranquilidade e distanciamento das interferências comuns ao lar, passou a ser uma boa opção nos dias atuais.
Pesquisas recentemente publicadas demonstram que a busca por imóveis com um espaço exclusivo para escritório aumentou em aproximadamente 80% em maio e 120% em agosto, comparando-se aos mesmos meses de 2019 e, ainda que o aluguel seja visto por alguns como um dinheiro desperdiçado, o cenário econômico incerto e os gastos com uma locação é opção a ser considerada, evitando fazer uma aquisição imobiliária que pode trazer algum arrependimento.
A locação, também nesses casos migratórios, é um bom instrumento tipo “teste-drive”, para uma aquisição mais consciente e menos impulsiva. Para estes testes existem ainda a possibilidade de realizarem contratos de locação com opções de compra.
Quando o interesse for mesmo só locatício e o imóvel contiver a possibilidade do uso misto (hibrido) o caso passa a ser um pouco mais complexo e deve ser explicitado no contrato de locação, em especial entre particulares.
Especial atenção ao que tange o significado de particular, em consonância com o termo “pessoa física” de inquilinos e proprietários. A este termo se contrapõem a ficção do termo “pessoa jurídica”, empreendedor, que assumem as figuras de inquilinos e de proprietários que negociam seus espaços para a locação. É o caso do contrato locatício híbrido tipificado entre lojista e shopping centers, onde o que prevalece é a vontade das partes, desde que não fira as disposições legais específicas da área. Neste caso as partes podem afastar a maioria das normas materiais da lei locatícia, mas não podem renunciar às ações nela previstas, que são instrumentos em benefício de uma das partes para resguardar seus direitos quando instalado um litígio.
Estas diferenciações entre locações comerciais e residenciais ficam mais claras nas afirmações do STJ, a seguir observadas:
... “O controle judicial sobre eventuais cláusulas abusivas em contratos empresariais é mais restrito do que em outros setores do Direito Privado, pois as negociações são entabuladas entre profissionais da área empresarial, observando regras costumeiramente seguidas pelos integrantes desse setor da economia. Concreção do princípio da autonomia privada no plano do Direito Empresarial, com maior força do que em outros setores do Direito Privado, em face da necessidade de prevalência dos princípios da livre iniciativa, da livre concorrência e da função social da empresa”. (STJ - REsp: 1409849 PR 2013/0342057-0, Relator: Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, Data de Julgamento: 26/04/2016, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 05/05/2016)
Assim sendo e indo direto ao ponto, temos que dois são os fatores essenciais e que sempre devem estar presentes nos contratos de locações residenciais e comerciais: a) finalidade da locação b) período que ficará locado. O período é o responsável por determinar o tempo que o locatário poderá usufruir do imóvel (residências 30 ou mais meses) e a finalidade uma imposição do proprietário quanto ao tipo de uso do imóvel, com determinação, ou não, deste período de uso (geralmente menor que 5 anos).
Na locação híbrida deve-se ainda ter especial cuidado quanto à possibilidade de haver restrições impostas pelas diretrizes do zoneamento municipal antes de efetivar o contrato misto. Visto isso, o contrato deve ser explicito quanto a predominância de sua finalidade, o espaço de tempo da locação e a qualificação das partes que celebrarão o contrato de locação.
Pelo todo exposto, finalmente, é muito prudente que os candidatos a locador e locatário contratem uma assessoria jurídica especializada para orientá-los na confecção e viabilidade da locação hibrida ou mista (comercial e residencial).
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